Alfabetização
Quando uma criança começa a se alfabetizar, ela já traz consigo uma série de hipóteses acerca do que é a escrita.
Estas hipóteses, descobertas nas pesquisas de Emília Ferreiro, vieram mudar o ângulo das perspectivas sobre como o aluno aprende a língua escrita, enfocando-a como um sistema de representação da língua falada, com significado social e fundamentando metodologias que se propõem a favorecer a construção do conhecimento.
Alfabetização, sob este enfoque, é uma atividade construtiva e criativa, isto é, deve fundamentar-se no valor que a leitura e a escrita têm na prática social, evoluindo para a construção de novos conhecimentos e a reconstrução conjunta de noções mais apropriadas. Trata-se de formar um aluno que, além de ler e escrever com competência, o faça também com crítica.
Para entendermos que uma criança pensa qualitativamente diferente do adulto, em relação à escrita, até chegar à hipótese alfabética, seguem-se, resumidamente, as principais características das fases pelas quais ela passa:
Nivél pré-silábico - não há preocupação com as propriedades sonoras da escrita. Há a busca de diferenciação entre as escritas produzidas, variando a quantidade de letras ou o repertório destas ou a posição das mesmas. Não existe relação fonema-grafema.
Exemplo : VAPDUVO ou DVOAPV ou MSALTUE
Nivel silábico - descobre que pode haver relação entre a palavra e a quantidade de partes da emissão oral. Há correspondência entre a representação escrita das palavras e suas propriedades sonoras. Em geral, a criança representa uma grafia para cada emissão oral, mas sua preocupação está mais em resolver quantas letras precisa para escrever uma palavra do que quais as letras para esta.
Exemplo: CAVALO ou CAVALO - KAO AVO
Enquanto encontra-se numa destas fases, a criança também constrói alguns
princípios, que são universais e que aplica as suas hipóteses, que são:
Quantidade mínima de caracteres (são necessárias, no mínimo, três letras para construir uma palavra);
Variedade de caracteres (letras iguais repetidas não formam uma palavra).
Neste sentido é comum observarmos o conflito que as crianças enfrentam para escrever palavras monossílabas e dissílabas. Há também a idéia de que, conforme o tamanho do objeto real que a palavra representa, será também o tamanho desta. Assim, formiga terá poucas letras e leão terá muitas. A isto chamamos de realismo nominal.
Nível silábico-alfabético - escreve parte da palavra aplicando a hipótese silábica e parte da palavra analisando os fonemas que compoem a emissão oral A (sílaba).
Exemplo: CAVALO ou CAVALO- CAVLO CAVAO
Nível alfabético - estabelece correspondência entre fonema e grafema. Consegue compreender que uma emissão oral (sílaba) pode ser formada por uma, duas ou três letras. Ainda há uma forte ligação com a oralidade, não havendo total domínio da ortografia, podendo aparecer, também, a separação indevida de palavras não usuais. Exemplo: FOLIA (para folha) ou CRIAOÇAS (para crianças) A QUELE (aquele)
Há ainda a tendência à supercorreção, numa tentativa de generalizar regras para a escrita. Por exemplo, se escrevemos vassoura, cenoura, tesoura, porque também não escrevemos PROFESOURA?
É neste momento que se deve trabalhar com a criança que aquilo que escrevemos pode ser diferente daquilo que falamos. Segundo Kato, a fala e a escrita são parcialmente isomórficas e parcialmente isolucionais”.
Por isso, é importante que mesmo sem estar lendo, a criança tenha contato com o máximo possível de materiais gráficos. Cartazes com alfabeto, poesias, histórias de eventos, propagandas, rótulos, livros infantis, circulares constituem materiais extremamente importantes para serem explorados pelos alunos, favorecendo o agir da criança sobre o objeto escrita.
E necessário, também, trabalhar o uso social da escrita, abrindo espaço para discutir com a criança: por que se escreve, o que se escreve e para quem. Escrever recados,Iistas e relatórios (de jogos, de passeios) são formas dela perceber que a escrita tem uma função comunicativa e que é necessário colocar as letras em uma certa ordem para que tenham significado e possam ser lidas.
É lendo e escrevendo que alguém aprende a ler e a escrever. Por isso, é importante que haja tempo para a criança ler, para falar, para escrever. Tempo, também, para jogar, pois o jogo, além de representar um desafio, é extremamente significativo e sabemos que uma criança que se sente desafiada, dentro de suas possibilidades, tem prazer em resolver o problema e, consequentemente, aprender. Jogos de letras, sílabas, palavras para a hipótese alfabética de escrita, uma vez que é preciso combinar, comparar e relacionar letras para formar palavras.
Isto reforça a idéia de que respeitar as hipóteses de pensamento de uma criança não é cair no espontaneísmo e deixá-la fazer o que quiser, quando e como quiser. Ao contrário, torna mais efetiva a tarefa do professor, que assume o papel de mediador entre aquele que aprende e o conteúdo a ser aprendido.
Regina Helena P. da Silva
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